sábado, 12 de abril de 2008

O Equilíbrio Ruim no Trânsito

Imagine a seguinte situação. Você está trafegando com seu carro e vai passar por um cruzamento. O sinal está verde para você, porém os carros da outra rua não respeitam o sinal vermelho e, indiscriminadamente, avançam mesmo assim. Você e outros motoristas são obrigados a parar, e o sinal fica vermelho para você. Se vocês não fizerem nada, ficarão lá parados até que haja uma brecha, que poderá ocorrer no sinal vermelho ou verde. O que vocês farão? Se viram os outros carros descumprindo a regra de trânsito, certamente avançarão, mesmo no sinal vermelho, antes que a situação anterior se repita e vocês continuem parados. Assim, inicia-se o caos. Conclusão: mesmo que o leitor seja um cumpridor contumaz da lei, é muito provável que vá transgredi-la na situação descrita.

Creio que o leitor que mora em São Paulo, principalmente, já passou por algo parecido. Geralmente, vê-se nessa situação quando um ônibus resolveu avançar a rua e acaba fechando trânsito. Os motoristas fechados reagem e, assim que podem, fecham o trânsito também, e todo mundo fica parado. Entretanto, se todos tivessem respeitado o sinal normalmente, o trânsito não estaria tão ruim.

Por que essa história toda? Para mostrar a situação de caos no trânsito que vivemos não decorre necessariamente de falta de educação no trânsito, mas de um hábito generalizado de descumprir a lei. Mesmo quem não quer descumpri-la, vê-se obrigado a agir assim ante as externalidades negativas originadas por outros motoristas. É quase incontrolável.

Os E.U.A. têm mais carros e é mais fácil obter a carteira de motorista do que no Brasil. No entanto, os acidentes fatais são em muito menor proporção, em razão da fiscalização que há. O custo de monitoramento por veículo nos E.U.A. é muito menor do que no Brasil, porque os motoristas de forma geral respeitam a lei. Não sei se a maioria deles desrespeita as leis de trânsito no Brasil, mas é certo que a proporção daqueles que desrespeitam é tão alta que o custo de monitoramento deles é excessivo, razão pela qual há esse número elevado de acidentes de trânsito em estradas e na cidade e, certamente, congestionamentos.

Há três mensagens que eu queria explicitar a partir dessa história. A primeira é que não adianta tornar mais caro o custo de se obter uma carteira de motorista no Brasil, se continuarmos com essa cultura de não fiscalizar e não punir quem descumpre as regras de trânsito. A segunda é a lição que o Daniel Santos me ensinou hoje: o número de descumprimentos da lei é não-linear, logo o número de fiscais poderá ter que ser bastante elevado para reduzir drasticamente os crimes de trânsito. Uma vez reduzidos, ainda assim terá que se manter um número elevado de fiscais para evitar que se volte à situação anterior de caos no trânsito. A terceira lição é que esse modelo poderia ser aplicado a outros comportamentos coletivos típicos que se observam no Brasil.

Antes que apareça algum heterodoxo desvairado dizendo que estou propondo aumentar os gastos públicos com mais fiscalização, cabe-me dizer que a proporção de renda expropriada da sociedade atualmente é mais do que suficiente para cobrir os custos adicionais de fiscalização. Trata-se apenas de uma realocação de recursos já existentes.

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