quinta-feira, 27 de março de 2008

Regra de Taylor nos EUA: Parte 2

Obs.: Veja o que é Regra de Taylor primeiro.

Motivação

Greenspan, em discurso à Associação Americana de Economia em 2004, disse duas coisas importantes:

a. A regra de Taylor não serve nem como prescrição, nem como descrição da política monetária da instituição que ele presidia;

b. Em cada reunião do comitê de política monetária, mudam-se os modelos, muda-se as respostas a cada variável. Logo, não havia regra, mas discricionaridade. Possivelmente, uma regra com coeficientes variantes poderia caracterizar a política monetária seguida no banco central, mas deveria incluir muito mais variáveis que eles observavam para tomar decisão.

Quer dizer: os pesquisadores diziam que havia, sim, uma regra; mas, o sujeito racional, que tomava decisão, dizia que não tinha. Então, os pesquisadores, que sabiam mais sobre o sujeito do que ele próprio, deviam estar certos. (Curioso. Bem, não conhecemos nossa função utilidade, mesmo assim, os economistas dizemos que ela existe... vai ver os heterodoxos estão certos.)

Além dessa motivação natural, há as evidências empíricas levantadas no post passado, como o leitor já conhece.

Proposta

O excesso de atividade utilizado em outras formulações pode não ter sido aquele usado pelo comitê de política monetária para definir os juros. Não é possível saber que excesso eles usaram, mas é possível estimá-lo conjuntamente com a regra. Dependendo de como for, a política monetária foi ativa (resposta à inflação superior a 1, indicando estabilidade inflacionária, segundo o Princípio de Taylor) durante o Greenspan.

Se o Greenspan diz que os coeficientes da regra são variáveis, deve ser porque são. Então, estimemos o modelo sob essa hipótese. A mesma técnica resolve o problema do coeficiente variável e do excesso de atividade não observado.

Resultados


Estimar a regra juntamente com o excesso de atividade não altera as conclusões anteriores. Quer dizer, a resposta do juros à inflação continua sendo num proporção menor do que um para um.

Estimando a regra juntamente com o excesso de atividade e permitindo que a resposta de juros varie ao longo do tempo, o coeficiente da inflação dificilmente fica maior do que 1, normalmente é inferior a um, e freqüentemente é negativo, particularmente durante o período Greenspan.

Conseqüências

A primeira conseqüência, creio, é que se comprovou que o Greenspan não mentiu. Quer dizer, a regra é totalmente discricionária, como havia sido dito.

A segunda conseqüência é a associação entre estabilidade e uma resposta à inflação menor do que o estabelicido no princípio de Taylor, mostrando-se, mais uma vez, que ele foi violado.

Se você estiver interessado no trabalho original, clique aqui.

Regra de Taylor nos EUA: Parte 1

Obs.: Veja o que é Regra de Taylor primeiro.

Senso Comum

Usando a Regra de Taylor para caracterizar a política monetária norte-americana, chegam-se, invariavelmente, a duas conclusões:

1. Antes de Paul Volcker tornar-se presidente do banco central americano em 1979, a política monetária norte-americana era instável;

2. Depois do Volcker, tornou-se estável.

Essa conclusão se demonstra calculando-se a resposta dos juros à inflação futura antes e depois do Volcker. Conclui-se que, antes, a resposta é menor do que 1; depois, maior do que 1.

O senso comum parece ter sentido, principalmente porque a inflação no período Greenspan foi muito baixa e o excesso (ou retração) da atividade econômica eram muitos baixo. Se a inflação estava controlada, o princípio de Taylor se aplica.

Inúmeros trabalhos chegam à mesma conclusão, inclusive alguns dizendo que a inflação americana antes do Volcker era estável também.

Problemas

Em minha tese, identifiquei dois problemas comuns a todos os trabalhos anteriores.

1. A data de quebra amostral em 1979 era arbitrária (explico melhor depois);

2. Para estimar a regra, é preciso ter o excesso de atividade, mas a atividade potencial não é observada. Trata-se, entretanto, de uma variável muito importante a determinar a magnitude dos coeficientes dessa regra, ou seja, a resposta dos juros à inflação e ao excesso de atividade. Os outros trabalhos usavam alguma metodologia para obter essa variável e a traziam para a regra exogenamente.

Evidência

Fiz dois exercícios simples. No primeiro, expando a amostra de outros trabalhos para abranger os períodos presidenciais do Volcker e do Greenspans. A resposta a inflação parece ser ainda maior que já havia sido calculado.

No segundo, deslizo a quebra amostral para o ínício do Greenspan. E obtenho resultados totalmente inesperados. Tudo se esvai. Antes de Greenspan, a resposta à inflação é menor do que a proporção um para um. Tudo bem, o período anterior ao Volcker pode estar conduzindo os resultados. Depois do Greenspan, a resposta à inflação cai drasticamente, chegando a ser até negativa, estatisticamente menor do que um em alguns casos, e, normalmente, é um coeficiente bastante volátil.

Conclusões Parciais

1. A data de quebra é fundamental.

2. Algo aconteceu na gestão Greenspan.

3. É a puxada da taxa de juros no período Volcker, época do segundo choque do petróleo, que está "viesando" o coeficiente da inflação para ser maior do que 1.

Regra de Taylor no Regime de Metas

Obs.: Veja o que é regra de Taylor primeiro.

Fundamentos


Na origem, a Regra de Taylor é muito ligada ao regime de metas. Taylor mesmo supõe uma meta implícita na regra. Além disso, os desenvolvimentos teóricos para justificá-la pressupunham a fixação de uma meta.

Então, em 1999, foi criado o regime de metas no Brasil, explicitamente anunciado.

Com o regime de metas também foi criada uma sistemática de coleta de informações sobre as expectativas futuras de inflação para os próximos 12 meses.

Assim, a equação para estimar a Regra de Taylor tinha que mudar. Em vez de colocar inflação, tem que colocar desvio da meta de inflação.

Resultados

Quando eu coloco na regra o desvio da meta em vez de expectativa de inflação futura, o coeficiente da inflação fica maior do que um. Não era surpresa, e estava previso teoricamente.

Mas, algumas surpresas apareceram. Primeiro, mantendo a idéia de usar a expectativa de inflação, como nos períodos anteriores ao regime de metas, a resposta dos juros à essa expectativa perde significância e magnitude.

Bem, coloquei inflação corrente na regra e obtive um coeficiente menor do que um, porém significante. E, pior, a regra descrevia a política monetária tão bem quanto usando o desvio da meta. Então, se o banco central diz que está olhando a inflação para o próximo ano, se há um regime de metas nesse sentido, cabem as perguntas:

1. Como, agora que o banco central está dizendo, explicitamente que persegue uma determinada inflação para os próximos 12 meses, não se consegue obter um coeficiente de expectativa signficante se, quando nada dizia, era possível extrair esse comportamento dele?
2. Como pode uma regra com inflação corrente descrever a mesma política monetária descrita por uma regra com desvios de meta, supostamente determinados por essa expectativa futura de inflação?

Quer dizer, tem algum coisa incoerente acontecendo.

Não tenho respostas para essas perguntas, não era o objetivo da minha tese. Entretanto, lá tem um gráfico em que eu mostro que a diferença entre inflação corrente e desvio da meta é só uma questão de magnitude, pois a direção de variação e intensidade é idêntica.

Conseqüências

A se comprovarem os resultados obtidos, cheguei às seguintes conclusões:

1. As autoridades monetárias não olham mais para o futuro, o que viola, de certa forma, o princípio de racionalidade dos agentes.
2. A inflação corrente determina os desvios da meta.
3. Como desvio e inflação corrente explicam igualmente a política monetária, e como a resposta dos juros à inflação corrente é menor do que 1, mais uma vez, violou-se o princípio de Taylor.

Paper Original

Se você quiser ler o paper original, clique aqui.

Regra de Taylor depois do Real

Obs.: Veja o que é regra de Taylor primeiro.

Resultados


Estimei a Regra de Taylor depois do Real para o Brasil, usando um modelo de expectativas racionais em que o banco central fixa a taxa de juros com base na expectativa futura de inflação e de excesso de atividade econômica. Neste caso, limitei os dados até dezembro de 1998, porque a desvalorização cambial abrupta de janeiro seguinte veio acompanhada de um aumento espetacular da taxa de juros. Esses dois movimentos, obviamente, podem influenciar muito os resultados finais, mas não caracterizam o período como um todo.

Pelo princípio de Taylor, o resultado deveria indicar que a resposta da taxa de juros à inflação devia ser superior à proporção de 1 para 1. Mais ainda, como já era superior a 1 antes da estabilização inflacionária, esperava-se que o coeficiente ficasse ainda maior.

Bem, o Brasil supreende, e o resultado mostrou que a resposta do banco central ainda é baseada nas expectativas futuras, porém numa proporção menor do que 1 para 1.

Há quem diga que os juros respondiam às reservas internacionais, porque a taxa de câmbio era fixa. Bem, não encontrei significância no coeficiente. Nas poucas vezes em que houver alguma significância, seu tamanho era baixo.

Conseqüência

A conseqüência mais importante é teórica, na verdade, pois, mais uma vez, violou-se o princípio de Taylor. Isso indica que o modelo que fundamenta essa regra pode estar furado.

Regra de Taylor durante a Megainflação do Brasil

Obs.: Veja o que é regra de Taylor primeiro.

Senso Comum


Dizia-se que a inflação brasileira até o advento do Real era inercial, porque os contratos eram indexados com base na inflação passada. Portanto, as pessoas olhavam para a inflação do passado e subiam os preços.

Tentei escrever um artigo sobre inflação inercial com meu amigo Marcos Tsuchida. Felizmente, o artigo não sobreviveu ao parecerista. Concluí que não havia entendido o que era inflação inercial. E, talvez por isso, tenha essa fixação para entender inflação, tema da minha tese de doutorado.

Inercial ou não, a inflação estava descontrolada. E, na época, dizia-se que as autoridades monetárias simplesmente referendavam esse ser, imprimindo a moeda corresponente ou aumentando os juros conforme "ela" determinava.

Intuição Econômica

Dito isso, pergunto: se você é um comerciante e sabe que a inflação do mês passado foi de 10%, por que você não aumenta seus preços em, digamos 15%, para ficar mais rico? Parece-me que essa seria a atitude racional dos comerciantes. E os demandantes, sabendo que os preços vão aumentar, tenderão a comprar tanto quanto conseguirem, quando recebem papel moeda. Se isso fizer algum sentido para você, creio que fazia para as autoridades monetárias também. Assim, eles percebiam esse movimento e, para evitar a hiperinflação, obrigatoriamente tinham que aumentar os juros numa proporção maior que a inflação VINDOURA, e não passada.

Resultados

A teoria de inflação inercial nunca prosperou, mas muita gente achava "evidências" dela em modelos econométricos de séries temporais.

Minha tese mostra que esses resultados estavam equivocados, e que a intuição anterior devia ser considerada mais detalhadamente. Para isso, uso como referência a Regra de Taylor.

Estabeleço um modelo de expectativas racionais em que os agentes olham para o futuro. Então, consigo mostrar empiricamente que as autoridades monetárias no Brasil faziam exatamente o que o Taylor propunha, isto é, fixavam a taxa de juros à proporção de 1,5 vezes a inflacão.

Se, em vez de usar a expectativa de inflação futura, eu usasse a inflação passada ou corrente, a resposta teria uma magnitude menor.

Conseqüências

Há três conseqüências a partir dos meus resultados. Primeiro, se a "teoria" de inflação inercial tivesse algum sentido, a resposta à inflação futura deveria ser menor ou igual a resposta à inflação corrente.

Segundo, as autoridades monetárias, e os agentes em geral, não são estúpidas de olhar apenas para trás, mas, sim, estabelecem suas perspectivas de futuro. Creio que este é um resultado bem interessante em contraposição ao consenso de outrora.

Terceiro, há uma associação entre descontrole inflacionário e reação à inflação numa proporção maior do que 1 para 1. Entretanto, não se estabiliza a inflação. Portanto, o princípio de Taylor foi violado.

Regra de Taylor

Fundamentos

O tema da minha tese de doutorado em Chicago é inflação. Não sei se lograrei êxito com a tese, mas já sei os resultados e vou descrevê-los aqui em vários comentários. O primeiro versa sobre Regra de Taylor, que é, de certa maneira, usada no Brasil.

Em 1993, John B. Taylor, professor de Economia de Stanford e então no banco central norte-americano, postulou que a taxa de juros nominal básica observada podia ser expressa por uma simples equação linear. Por essa equação, a taxa de juros responde à inflação e ao excesso de nível de atividade da economia. Em outras palavras, o banco central fixava a taxa de juros segundo uma regra simples: a relação entre juros e inflação devia ser 1,5 para 1, e a relação entre juros e excesso de atividade devia ser 1 para 0,5:

juros nominal = 1,5 x inflação + 0,5 x excesso de atividade.

Intuição

Qual é a intuição da equação? Com relação à inflação é a seguinte. Se a inflação subir, a taxa de juros nominal deve crescer mais rapidamente, para aumentar a taxa de juros real da economia. Ora a inflação representa uma aumento de preços devido a pressões de demanda ou aumento de custos. Aumentando a taxa de juros reais, os consumidores preferirão poupar, reduzindo a demanda. Isso deve aliviar as pressões sobre os custos e descomprimir os preços.

Quanto ao excesso de atividade, a lógica é mais sutil. Existe uma ficção em economia chamada produto potencial, que mede a capacidade da economia produzir sem gerar pressões inflacionárias. Isso não é observado, mas uma analogia com os indivíduos pode ser feita, desde que lembremos que o produto potencial não mede a capacidade máxima de produção.

Suponha um assalariado, cujo contrato estabelece um salário fixo em troca de 8 horas de trabalho, e, se houver hora extra, o salário/hora aumenta em, digamos, 50%. Nesse exemplo, o produto potencial é medido com 8 horas de trabalho. A partir desse ponto, o salário aumenta. Se toda a economia resolver fazer hora extra, haverá excesso de produção em relação ao produto potencial. A renda das pessoas vai aumentar, o que deverá gerar pressões inflacionárias do lado da demanda. Mas os custos médios também vão aumentar, o que gerará aumento de preços do lado da oferta. Em razão disso, a regra de Taylor postula um aumento de taxa de juros para desincentivar o excesso de atividade, desviando recursos para poupança.


Desdobramentos

Depois da evidência empírica apresentada por Taylor, a pesquisa em teoria monetária voltou-se para definir os fundamentos que poderiam justicar essa regra. Versões mais elegantes foram desenvolvidas, pelas quais o banco central fixa o juros com base nas expectativas futuras de inflação e excesso de atividade. A pesquisa empírica procura calcular os coeficientes da regra. Serão mesmo 1,5 e 0,5, respectivamente?

Um dos corolários da regra, também conhecido como princípio de Taylor é o seguinte: há estabilidade inflacionária se, e somente se, o coeficiente da inflação é maior do que 1. Vale o contrário: há instabilidade inflacionária se, e somente se, o coeficiente da inflação é menor do que 1.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Greenspan

A "crise" que vivemos presentemente é culpa do Greenspan que manteve a taxa de juros baixa durante muito tempo, dando margem aos empréstimos indiscriminados dos bancos, e multiplicação dos derivativos lastreados em hipoteca.

A frase anterior é a interpretação da mídia sobre uma crítica originalmente feita pelo Rogoff. A interpretação está sutilmente errada. O que o Rogoff disse é que o Greenspan, ante o benefício de olhar para o passado a partir de hoje, reconheça que errou quando tomou sua decisão.

Farei alguns comentários para delinear melhor o debate, se for possível, e nortear argumentos.

1. O Greenpan é um dos membros do comitê que toma decisões e nem sempre vence as votações. Nesse comitê há um monte de gente inteligente que toma decisões e é assessorada por outro monte de gente inteligente. Entretanto, é fácil fazê-lo ser o bode expiatório da vez, como se isso fosse levar a algum lugar;

2. O comitê de política monetária tomou decisões com base nas informações do momento. Não tem o menor sentido dizer que é preciso reconhecer o erro. A questão é saber ser a decisão foi correta, com base nas informações de então. O Rogoff diz que havia condições de tomar outras decisões com base em certas evidências de então, o que me leva ao próximo ponto.

3. O Rogoff via muitas evidências, mas o bando de gente inteligente que eu citei não via. Quer dizer que o Rogoff é clarividente? Não, só quer dizer que, às vezes, ele acerta. É assim, os economistas acabamos fazendo previsões o tempo todo, algumas acertamos, outras erramos. O comitê de política pode ter errado, mas acertou muitas vezes.

4. Ainda não á claro que o comitê errou nem por que teria errado.

5. Se os bancos emprestaram demais, por excesso de liquidez, é preciso entender que foi liberalidade do banco. Os bancos também podem ter errado e perdido um pouco a noção do risco. Nesse sentido, creio ter sido péssimo salvar o Bears, porque gera incentivos para repetir esse comportamento pernicioso. Quando falam que haveria uma crise sistêmica que poderia levar à falência de outros bancos, é sempre bom pensar na dinâmica do processo. Sim, haveria um certo caos, mas as instituições vindouras seriam mais sólidas. A questão é medir o que gera mais bem estar. Minha suspeita, mas sem provas, é que deixar falir hoje gera mais bem estar intertemporal.

Monocultura

O Brasil viveu a monocultura do pau-brasil, da cana, da mineração, do café e entramos no século passado. Qual é a monocultura da vez?

Para não dizer que é da política, da cultura, da ideologia, direi simplesmente que é a monocultura das idéias econômicas. Por quê?

O debate econômico neste país é pobre de uma maneira geral, mas em particular entre os partidos. É pobre de maneira geral, porque os veículos de comunição têm colunistas predominantemente heterodoxos. O pior são os partidos, pois a discussão se restringe a definir se um vai gastar mais em saúde ou em educação ou em segurança ou em...

Não há um debate realmente de idéias econômicas do tipo: será que a redução drástica de impostos promove o desenvolvimento?

Enfim, é sempre mais do mesmo. E o pior é ter gente que ainda acha que vivemos em pleno "neoliberalismo", seja lá o que isso significa.